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Mostrando postagens de janeiro, 2013

SAUDADES DO RIO

Ir para casa ao entardecer. A residência ficava na Rua das Belas Noites, uma quase imperceptível ladeira entre a rua dos Barbonos e o Passeio Público. Neste as árvores, já de bom porte, disfarçavam a lagoa aterrada dos tempos do Vice-Rei Luís de Vasconcelos, que para tal fim mandou arrasar o morro das Mangueiras. Que ficava bem ali, onde hoje é o Largo da Lapa. Foi também o Vice-Rei o responsável pela abertura da nossa rua, a qual o povo já está apelidando "das Marrecas", por causa do chafariz de Mestre Valentim, bem lá em cima, junto com os Barbonos. Vizinha, a escola de música do Padre José Maurício, onde antigamente os jovens irmãos, o Príncipe e a Princesa tomavam aulas. Embora as infindáveis escalas praticadas no pianoforte ou no cravo amolassem um pouco pela repetição maçante, tínhamos paciência; a compensação vinha quando o próprio padre nos brindava com uma que outra de suas magníficas peças: Estudos, Oratórios Salve-Regina, Laudemus, etc. De onde igualmente fluía

SIC TRANSIT

Muito medo. Primeira vez cinco, seis anos. A prima da mãe. Cemitério enorme, cinza. Mausoléus revestidos de pó de pedra. Pequenos postigos de vidros empoeirados. Do lado de dentro, esgares. Cadáveres espiavam. Esperavam. Sol a pino, calor. Noite. Para casa depois do trabalho. Olhava sem querer pela janela do ônibus. Muros altos, não o bastante para impedir a visão da arquitetura funerária. Sempre virava a cara, mas acabava olhando. Adulto, já, e ainda esse susto de cemitério. Um dia o pai morreu e foram a enterrar-lhe o corpo. O primeiro de muitos velórios suportados. De lá para cá, de cá para lá. Cada vez o ambiente mais familiar; aquela árvore cresceu desde a última vez, está melhor, está  mais mal cuidado. Moscas aumentaram muito este ano. Chove. Lama nos sapatos. Com o Sol, poeira. Cada vez mais longe ficavam as covas, cada vez  mais. Cansaço. Raras vezes ia até o fim, agora. Compreendiam. Os cadáveres agora sorriam, afetivos. Distraiu-se pensando na vida. Vieram e aferrolh

A SELEÇÃO DA PARAÍBA

Existem pessoas das quais instintivamente gostamos. Elas emitem um não-sei-quê, irradiam uma “aura”, possuem uma simpatia natural que faz amigo devotado de cada um que delas se aproxima. Francisco Arnaud Diniz, o “Chico Arnaud da Paraíba” certamente é uma dessas afortunadas pessoas. Era amigo dele antes mesmo de conhecê-lo pessoalmente, de tanto ouvir falar (bem e muito bem) a seu respeito, por um amigo comum, também paraibano. Valter era meu chefe no trabalho, quando morava ainda no Rio de Janeiro. Conservava fielmente as amizades da sua Paraíba natal, e nenhuma era mais frequentemente citada que o Chico Arnaud. Chico e seus casos, Chico e suas histórias próprias e dos outros. Anos depois, chegando em Recife onde passaria a trabalhar transferido do Paraná, estava ansioso para encontrar o famoso personagem das histórias do Valter. E por coincidência ele era um dos chefes de divisão da minha Superintendência, ou seja, ia trabalhar comigo! Entretanto houve um atraso nesse enc
O AMERICANO QUE GOSTAVA DE PASSARINHO Segundo conta meu primo Fernando da Matta Machado, tio João, seu pai, sempre que rememorava sua infância falava sobre “os terríveis moleques de Diamantina, verdadeiros traquinas”. Claro que ele e seu irmão mais próximo, Carlos eram da turma! Naqueles tempos havia por lá um americano que resolvera vir fazer fortuna na América do Sul. Muito empreendedor, o ianque logo logo entrou em inúmeros negócios lucrativos: entre eles construiu a primeira estrada que ligava o velho Tejuco à antiga Curralinho, hoje a cidade de Corinto. Com isso ficou rico e pode comprar para si e sua família uma boa casa com enorme quintal. Era um admirador da flora e da fauna e principalmente adorava os passarinhos do espinhaço mineiro. Para estes últimos, fez construir no terreno um imenso viveiro que acomodaria centenas de pássaros e logo comunicou à meninada que pagaria pelos que fossem apanhados pelos moleques. Daí para a frente não falhava um dia sem que houves

POESIA É MUITO CHATO MAS A GENTE PERSEVERA...

M E N I N O Fugia de casa subia no morro sumia no mato o Sol! O Sol! Fazia uma pipa na linha cerol de cola e de vidro moído no trilho da linha do bonde. Uma vez foi um deles que quase virou saindo dos trilhos por causa do pó. Meu pai riu tanto quando escutou. Mas é que foi Zico amigo do peito quem me contou.