VAN JÁVAI VAN JÁVEM.... (Stalisnaw Ponte Preta)








   

     ERA UMA VEZ, há muito e muito tempo, quando havia um jogo chamado "futebol". Parece que foram os ingleses os primeiros a inventarem regras ("rule Britannia!" - já conclamava a Rainha Victoria): delimitaram o campo, colocaram balizas, etc. Antes se jogava com côco, crânios, filhotes de carneiros (até hoje ainda se joga assim nas planícies mongóis - eles acham divertidíssimo), e até bola, um "cubo esférico" (disse-o um matemático semana passada), cheio de ar, pesando algumas libras e etc.: aquelas medidas de peso complicadíssimas (inglesas of course).
     Vanja vai, Vanja vem, houve um país, naqueles tempos remotos, que se declarou o dono da bola, o rei do jogo, por aí. Era um paiseco onde todos roubavam, desde que suas terras foram destapadas, no dizer dos europeus que primeiro lá chegaram. E imediatamente os gajos (como eram chamados) começaram a nos roubar: terras, minerais preciosos, madeiras de lei , etc., tudo fundamentado por uma complicada crença que diziam ser católica, mas eram pretextos mentirosos e imorais para o aviltante roubo. Servia para acalmar suas consciências(?), enquanto saqueavam, matavam, estrupavam, destruíam o meio ambiente, promoviam a desertificação de áreas imensas, enfim, um horror, o horror! disse um deles lá, um polonês que "inglesou" o nome e a sua escrita, fazendo muito sucesso entre seus pares(*).
      Com essa criminosa desculpa, os habitantes do tal país, além de permitirem que o roubo continuasse séculos afora, também eles (ou alguns deles) começaram a participar do assalto, amealhando, dessa maneira, fortunas imensas.
     Esses gatunos eram prolíficos e logo deixaram imensa descendência, toda ela calcada nos mesmos princípios aéticos e imorais dos antepassados: daí então que a sociologia descobriu uma nova classe social, existente nesse infeliz lugar: a CASA GRANDE. E como toda tese traz em si a sua antítese, logo logo viram que o "resto" - a imensa maioria - era a ZENZALA.
     Apesar de todos esses percalços, não foi que o tal país cresceu? de maneira penosa (sem trocadilhos, por favor), enfrentando todo tipo de dificuldades, de armadilhas colocadas em seu caminho pelos larápios internacionais e nacionais, o povo foi se educando da maneira que era possível, foi se multiplicando, foi percebendo que não havia motivo algum para viver "de favor" na terra que era desde sempre deles. Não podiam aceitar mais o infamante epíteto de invasores, quando eram os legítimos senhores. Eles, o povo, e não aquele punhado de "happy few", os moradores da casa grande.
     E começaram, a princípio de modo tímido (e apanhando muito da polícia) a reivindicarem seus direitos de cidadão, embora a maioria nem soubesse direito o significado da palavra. Mas esse movimento inicial tomou corpo, veio crescendo, aos trancos e barrancos, mas crescendo, tomando fôlego, virando uma onda no mar, cada vez maior, um "tsunami" humano se aproximando da costa da pirataria, que apavorada não enxergava mais como escapar.
     O "horror" do Conrad (o tal escritor polonês) não é, como pensam esses  elementos privilegiados (que gostam tanto de lê-lo, pois tem "mensagem" - como se um carteiro o autor fora) o coração das trevas, o ignoto, o desconhecido, o atávico medo ancestral do escuro, das feras traiçoeiras, do aniquilamento: o verdadeiro horror infernal é exatamente o que essa classe dos detentores do poder universal implantam nos corações e mentes da maioria, para melhor destroça-la aos poucos e ir engolindo-a aos pedaços. É o gene defeituoso que essa gentalha tem.
     O "horror" é a fome imposta, a ausência de saneamento, de escolaridade, a ignorância, a falta de meios eficazes de autocontrole da natalidade, a falta de moradia, de hospitais, de escolas, de transporte eficaz e de emprego. Foi tudo isso que há muito pouco tempo, uma fração de segundo a considerar os quinhentos e tantos anos do "destapamento", que começamos a ter, com governos efetivamente preocupados em minorar essa infame dicotomia imposta a ferro e fogo pelos "Donos do Poder"(**).
     Então estes últimos iniciaram uma sórdida campanha de desmoralização dos governantes, ao mesmo tempo em que promoviam uma verdadeira "cruzada santa do pau oco" em favor dos seus representantes. E quanto mais infame é essa campanha, mais percebemos o cinismo deles: arregimentam pessoas inicialmente bem preparadas, com algum tipo de percepção dos verdadeiros problemas nacionais, mais que possuam um ego de bom tamanho. E é com essa vaidade que eles trabalham, promovendo inicialmente uma "lavagem cerebral", uma doutrinação que arranque de seus corações e mentes quaisquer sentimentos que possam ainda ter em relação ao problema social, transformando-o, como disse um deles há muitos anos em "caso de polícia". Então, o que deixam permanecer, fortificado, engrandecido güela abaixo como um marreco é somente o mencionado "ego",  mais e mais senhor de toda a personalidade do candidato. A vaidade se torna seu farol, sua bússola a guiar seus passos, sua estrela guia, seu Norte. Por trás dos panos manobra o verdadeiro governo, no dizer dos franceses, "L'éminence Grise" o controlador de marionetes.
     Isso, que  foi um fato imutável durante cinco séculos, agora vem deixando lentamente de sê-lo para virar um passado do qual todos um dia vamos esquecer. O avanço, entretanto é difícil e sujeito a retrocessos. Agora mesmo haverá uma eleição nesse país:  de um lado, as forças progressistas irmanadas a todo o povo, lutam para que as conquistas dos últimos anos continuem. A candidata desses é a atual governante, dizem que uma senhora voluntariosa, pouco afeita ao diálogo, impaciente com os meandros da política, com escasso trato social; mas uma pessoa honrada, digna, trabalhadora e com o sentimento de pátria incrustado no coração; contra essa e apostando no retrocesso, os conservadores e demais forças reacionárias trouxeram um jovem bem-apessoado, bom rapaz, "de boa família", cuja carreira política desenvolveu-se à sombra de seu avô, famoso político da escola conservadora.
     A tática não muda: o papel celofane é novo, enfeitado com fitas verde-amarelas, reluzente: o pão é feito da mesma massa, do engano da fraude, da mentira, do golpismo, da falsidade. Para isso os cordões são manejados magistralmente, de tal forma que uma pessoa ainda não inteiramente preparada se transforme no "líder infalível e todo-poderoso que irá nos redimir". De quê? Pergunto. O que anda errado no "país do futebol"? Será que pensam que a desgraceira de ontem, quando a Seleção do país sofreu um terrível abalo, sendo humilhantemente derrotada? Acho que não. Futebol é isso. Apesar dos pesares, é somente um jogo. Do qual aliás o povo foi expulso, quando entregaram a organização para um conhecido grupo de bandidos internacionais que açambarcaram tudo o que envolvia o esporte e começaram com os abusivos e indecentes preços dos ingressos. Só pequena parcela da população conseguia adquiri-los, talvez menos de 0,5% (em termos populacionais isso dá um milhão de pessoas aproximadamente: apenas um punhado de gente, se considerarmos o total). No entanto mais do que suficiente para encher os estádios ("arenas" na malícia dos enganadores) e aparentar um cenário diferente da realidade, que foram os telões gratuitos em locais populares e as TVs dos botequins da vida.
     Continuando essas reflexões já de noite, vi que a Argentina classificou-se nos pênaltis para a final contra os alemães. Torço pela primeira.  Uma vez que ela, a taça, não passou de miragem para nós, que fique aqui por perto. E que a próxima competição traga alegrias para nós e finalmente ela seja livre de manipulações criminosas, dos roubos, da chicana. Quanto ao outro jogo, esse verdadeiramente fundamental para a nação, que seja o povo seu único vencedor.
(*) O nome do moço era Jósef Teodor Konrad Nalecs Korzeniowski. Apesar da grande admiração que nutria pelas baleias, achou que seu nome próprio era um descomunal cetáceo a lhe tolher o caminho da glória literária, e assim o anglicalizou para Joseph Conrad.
(**) "Os Donos do Poder" é uma das obras fundamentais do nosso país. Escrita em meados do Século XX, seu autor, um advogado e pensador chamado Raimundo Faoro, enquanto vivo deixava uma luminosa trilha de seus passos pelo Brasil afora, aclarando com seus conceitos e o afiado senso de proporção e crítica as mentes (e por que não os corações) daqueles que tinham contato com seu verbo candente e preciso.

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