MIGUEL TORGA (2) - Nasceu Adolfo Correia Rocha em 12 de agosto de 1907. Portugal. O vilarejo chama-se São Martinho de Anta, província de Vila Real, Trás os Montes. Sua aldeia e província são cenários de inúmeros contos, novelas e poemas. Uma das regiões mais pobres e desassistidas do planeta. Talvez por isso seus habitantes desenvolveram meios de sobrevivência tão peculiares, e inventivos, relatados por ele em sua obra. Mesmo assim, às vezes nem isso bastava e as fomes dizimavam populações. Desde tempos imemoriais até a pouco menos de um século, morria-se na míngua, nas montanhas do noroeste português. Miguel Torga, filho de lavradores, o ramo paupérrimo da família, empregou-se, menino ainda, como lacaio de libré em casa apalaçada dos parentes ricos do Porto. 
     Depois foram os estudos, a vinda para o Brasil, o tio, cafeicultor,  rigoroso e até rude, mas apesar disso sabendo vislumbrar no sobrinho dotes de inteligência que o  fizeram bancar seus estudos, primeiro no Ginásio Leopoldinense, em Leopoldina, MG, e depois, como prêmio pelo  esforço e perseverança do jovem Adolfo nas lides do campo, sustentando-lhe o curso de medicina em Coimbra.
     Fico imaginando como teria sido para o meu ancestral português, pouco menos de trezentos anos antes, na mesmíssima região (era de Freixo de Espada à Cinta): com certeza a pobreza era ainda mais dramática, a fome maior. No século dezessete Portugal, colônia inglesa, só devia importar à Grande Bretanha do Norte pelo vinho do porto, na região do mesmo nome, e pela cortiça para as rolhas, ao sul. As imensas colônias ao redor do planeta para quase nada serviam: aquelas que possuíam alguma riqueza (caso da Índia e poucas outras) logo logo foram administradas diretamente pelo poder dominante. Lugares sem a menor expressão econômica (Brasil entre eles) viviam à matroca. Não existia ainda o cultivo do café, os terrenos da cana nordestina se mostravam exauridos e o que ainda restara era dos holandeses. Minerais valiosos e gemas raras eram produzidos, milagrosamente, somente a oeste dos Andes: como se estes limitassem geologicamente o território. Aos espanhóis, louvores e lavores; aos portugueses, somente dores.
     Mesmo assim vinha-se para o Brasil. Devia ser menos pavoroso que as condições de vida(?) que enfrentavam os tramontinos naquela época. Dois séculos e meio depois, a conjuntura  já era outra. Aqui. Lá, a fome, o desânimo haviam crescido. Torga foi a planta selvagem que floresceu nesse ambiente tão profundamente escalavrado pelas vicissitudes. Sua fisionomia granítica denunciava-lhe a origem, seu nom de plume traduziu sua certeza de que mesmo ambientes sáfaros a esperança um dia medra.

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